Por Salim Lamrani - Marília Guimarães nasceucorinthians e guarani palpiteuma famíliacorinthians e guarani palpiteclasse médiacorinthians e guarani palpiteorigem portuguesacorinthians e guarani palpite1945corinthians e guarani palpiteOuro Preto, Minas Gerais, no sudeste do Brasil. Marcada pelas injustiças e desigualdades sociais que afetavam seus compatriotas, desde cedo tomou consciência da realidade da lutacorinthians e guarani palpiteclasses.

Após o golpe militar que derrubou o governo democraticamente eleitocorinthians e guarani palpiteJoão Goulartcorinthians e guarani palpite1964, Marília Guimarães mudou seu nomecorinthians e guarani palpiteguerra para Miriam e se juntou à luta armada contra a junta golpista como membro da organização Vanguarda Popular Revolucionária. Ela abriu uma escola como fachada para suas atividades militantes. Desmascarada pelo regime, passou à clandestinidade para escapar do destino normalmente reservado aos oponentes políticos. Depoiscorinthians e guarani palpiteum ano na clandestinidade,corinthians e guarani palpitejaneirocorinthians e guarani palpite1970, decidiu sequestrar um avião, acompanhadacorinthians e guarani palpiteseus dois filhos, Marcello e Eduardo,corinthians e guarani palpitetrês e dois anos respectivamente, e buscar asilocorinthians e guarani palpiteCuba. Durante os preparativos para a operação, ela confiou seus filhos por quinze dias a uma jovem ativista chamada Dilma Rousseff, que viria a se tornar a primeira mulher presidente do Brasil. Depoiscorinthians e guarani palpiteuma longa viagemcorinthians e guarani palpitevários dias pelo Uruguai, Argentina, Chile, Peru e Panamá, Marília Guimarães finalmente chegou à ilha onde passaria os próximos dez anoscorinthians e guarani palpitesua vida. No decorrer dessas conversas, Marília Guimarães conta a históriacorinthians e guarani palpiteseu ativismo contra o regime golpista no Brasil e detalha a odisseia que a levou a Havana. Ela descrevecorinthians e guarani palpitenova vidacorinthians e guarani palpiteuma sociedade marcada pelo fervor revolucionário e seus encontros com os principais líderes políticos do país, como Fidel Castro, Raúl Castro e Ramiro Valdés. Ela também conheceu figuras emblemáticas do anticolonialismo, como Almicar Cabral, líder históricocorinthians e guarani palpiteGuiné-Bissau e Cabo Verde, e seu irmão Luís Cabral, primeiro presidentecorinthians e guarani palpiteGuiné-Bissau e Cabo Verde. Acimacorinthians e guarani palpitetudo, ela fez amizades duradouras com os principais artistas da Nueva Trova, como Silvio Rodríguez, Pablo Milanés, Augusto Blanca, Vicente Feliú e muitos outros. Depoiscorinthians e guarani palpitepassar uma décadacorinthians e guarani palpiteCuba, ela retornou ao Brasil após a aprovação da leicorinthians e guarani palpiteanistia, mas não abandonou seu compromisso com um mundo mais justo. Foi lá que ela conheceu Lula da Silva, que se tornou seu amigo e a quem ela apoiou ativamente emcorinthians e guarani palpitecarreira política, especialmente durante a última campanha presidencial que o levou à vitória.
Salim Lamrani: Quem é Marília Guimarães? Que lembranças você temcorinthians e guarani palpitesua infância? Como foicorinthians e guarani palpiteeducação?
Marília Guimarães: Nascicorinthians e guarani palpiteuma cidade histórica chamada Ouro Preto, no estadocorinthians e guarani palpiteMinas Gerais, no sudeste do Brasil. Foi aqui que os portugueses, que haviam colonizado o país, começaram a explorar as primeiras riquezas do nosso continente. A cidade recebeu esse nome porque o ouro extraído nessa área tinha uma cor escura. É uma bela cidade e um Patrimônio Mundial.

Foi aqui que ocorreu a revolta da Inconfidência Mineiracorinthians e guarani palpite1789, quando os defensores da independência brasileira expressaram seu desejocorinthians e guarani palpitese separarcorinthians e guarani palpitePortugal. Um desses ativistas era um poeta chamado Tomás Antônio Gonzaga. Ele havia se apaixonado por uma moça, mas não podia revelarcorinthians e guarani palpiteidentidade porque vivia escondido devido ao seu compromisso político. Naquela época, a cidade era pequena. O nome da moça era Marília, que se tornaria Maríliacorinthians e guarani palpiteDirceucorinthians e guarani palpiteseus poemas. Preso e encarcerado, Gonzaga foi deportado para a África, para Moçambique, onde terminaria seus dias, rompendo assim seu casocorinthians e guarani palpiteamor com Marília e pondo um fim temporário à luta pela independência.

Meu pai, que era apaixonado por história e liberdade, decidiu me chamarcorinthians e guarani palpiteMarília. Tenho muito orgulhocorinthians e guarani palpiteser chamadacorinthians e guarani palpiteMarília. Meus antepassados eram portugueses, assim como meus avós. Fui criada com a nostalgia do fado e a alegria característica dos negros africanos que foram deportados para a América como escravos. Portanto, minha personalidade é caracterizada por essa misturacorinthians e guarani palpitenostalgia e alegria. Portanto, sou origináriocorinthians e guarani palpitePortugal e da África. Desde muito cedo, herdamos a tradiçãocorinthians e guarani palpiteluta dos africanos que, mesmo tendo sido submetidos à escravidão, sempre se levantaram contra a opressão. Foram eles que construíram o Brasil.

Minha avó era proprietáriacorinthians e guarani palpiteuma fazenda. Seus empregados eram ex-escravos. Ela estava muito ciente das realidades sociais e da situação das pessoas mais pobres. Eles frequentemente iam àcorinthians e guarani palpitecasacorinthians e guarani palpitebuscacorinthians e guarani palpitetrabalho ou comida. Durante minhas férias emcorinthians e guarani palpitecasa, testemunhei isso e percebi que ocupávamos espaços muito diferentes na sociedade. Enquanto eu tinha tudo o que precisava, outros vinham implorar por um pedaçocorinthians e guarani palpitepão. Isso foi algo que realmente me afetou e ficou comigo desde então.

SL: O que você lembra sobrecorinthians e guarani palpiteescolaridade?

MG: Estudeicorinthians e guarani palpiteuma escola internacional dirigida por franceses. Havia belgas, portugueses e ingleses. A influência francesa sempre foi muito importante no Brasil. Muitas escolas eram dirigidas por freiras francesas e o francês era falado como primeira língua. Foi somente na décadacorinthians e guarani palpite1950 que uma lei foi aprovada proibindo escolas onde o português era ensinado como segundo idioma. A língua brasileira está repletacorinthians e guarani palpiteneologismos franceses. Dizemos abat-jour, por exemplo. O português falado na África tem a fonética portuguesa, enquanto o brasileiro está mais próximo da fonética francesa. Em Angola e Moçambique, por exemplo, a língua tem uma musicalidade diferente da nossa. É preciso lembrar que, na época, o mundo inteiro estava se rebelando contra o colonialismo, contra a ascensão do capitalismo que se instalavacorinthians e guarani palpitetoda parte. Portanto, cresci nesse contextocorinthians e guarani palpiteagitação que permeava universidades e escolascorinthians e guarani palpiteensino médiocorinthians e guarani palpitetodo o mundo. Quando adolescentes, éramos rebeldes por natureza. Queríamos conquistar e mudar o mundo. Não havia nada mais bonito do que lutar contra o opressor. Como todos os outros jovens da minha geração, fui pego por essa onda.

Compromisso político

SL: Quais foram suas principais fontescorinthians e guarani palpiteinspiração?
MG: A Revolução Russacorinthians e guarani palpiteoutubrocorinthians e guarani palpite1917 e o nascimento da União Soviética deixaramcorinthians e guarani palpitemarca no mundo. Nós lemos Marx, Lênin e Stalin. Inicialmente, éramos stalinistas porque era mais fácil estudar o leninismo por meiocorinthians e guarani palpiteStalin. Lênin era um grande intelectual e seus escritos não eram acessíveis a todos. A prosacorinthians e guarani palpiteStalin, por outro lado, era mais acessível à maioria das pessoas e era mais fácil para nós ganhar seguidores por meiocorinthians e guarani palpiteseus textos. Depois disso, evoluímos e voltamos a Lênin.
SL: Em 1964, uma junta militar orquestrou um golpe contra o presidente democraticamente eleito João Goulart, com o apoio dos Estados Unidos. Qual foi a reação dos jovens brasileiros?
MG: João Goulart era a favor da reforma agrária e queria promover mudanças estruturais no Brasil. Ele foi forçado ao exílio pelos golpistas, que ameaçaram tirarcorinthians e guarani palpitevida se ele persistissecorinthians e guarani palpitepermanecer no país. Cercacorinthians e guarani palpite90% dos ativistas do Partido Comunista Brasileiro (PCB) também foram forçados ao exílio, após a prisãocorinthians e guarani palpitevárioscorinthians e guarani palpiteseus companheiros pelas forças militares. Os jovens ativistas nas universidades, inclusive eu, estavam procurando uma maneiracorinthians e guarani palpitepôr fim à ditadura. Carlos Marighella, ex-membro do PCB, criou a organização revolucionária Ação Libertadora Nacionalcorinthians e guarani palpite1968, com o objetivocorinthians e guarani palpiteunir todas as forçascorinthians e guarani palpiteoposição do país. Ele é uma figura emblemática da resistência brasileira. Clemente era seu nomecorinthians e guarani palpiteguerra.

SL: Você fazia parte desse grupo?

MG: Não, entreicorinthians e guarani palpiteoutra organização chamada Vanguarda Popular Revolucionária. Tínhamos decidido lutar contra a ditadura e estávamos tentando encontrar a melhor maneiracorinthians e guarani palpitelidar com o exército. Éramos poucos e não tínhamos armas, mas éramos movidos por um grande desejocorinthians e guarani palpitemudar o mundo. O PCB havia sido dizimado, então criamos organizações paralelas com uma nova ideia: a luta armada. Nosso objetivo era enfrentar a ditadura militar.

O equilíbriocorinthians e guarani palpiteforças era desigual. Éramos muito jovens, não tínhamos dinheiro e não tínhamos o conhecimento necessário para liderar um projetocorinthians e guarani palpiteluta armada, embora tivéssemos começado a ler tudo o que havia disponível sobre o assunto. Havia uma pequena ilha no Caribe que havia travado uma guerracorinthians e guarani palpiteguerrilha e tínhamos Cuba como modelo. Mas o Brasil é um país enorme. Como criar célulascorinthians e guarani palpiteguerrilhacorinthians e guarani palpiteforma semelhante àcorinthians e guarani palpiteCuba? Você precisacorinthians e guarani palpitemuita gente, muito dinheiro e muito treinamento. Além disso, embora o exército brasileiro nunca tenha sido um grande exército, ele era muito mais bem estruturado do que nossas organizações.

SL: Quais foram suas primeiras missões?

MG: Nosso primeiro trabalho foicorinthians e guarani palpiteconscientização. Depois disso, passamos a agircorinthians e guarani palpiteforma mais ousada, atacando quartéis para conseguir armas. Também aprendemos a sobreviver na floresta. Há uma grande diferença entre o Brasil e Cuba. Na ilha, os animais não são peçonhentos, enquanto aqui é exatamente o contrário: as cobras são extremamente venenosas e as picadas podem ser fatais. Em Cuba, a luta armada ocorreu na Sierra Maestra, que é uma floresta pequena se comparada à Amazônia. Portanto, a experiência cubana tevecorinthians e guarani palpiteser adaptada às realidades geográficas do Brasil.

A junta militar lançou uma campanhacorinthians e guarani palpiterepressão severa e começou a prender ativistas, como aconteceucorinthians e guarani palpiteoutros países do continente onde ditaduras do mesmo tipo estavam no poder. A tortura foi sistematicamente aplicada aos oponentes para extrair informações. Os atoscorinthians e guarani palpitetortura eram indescritivelmente atrozes e desumanos. Os prisioneiros eram cortados com lâminascorinthians e guarani palpitebarbear e submetidos a choques elétricos. Depois, nas primeiras horas da manhã, eles colocavam essas pessoascorinthians e guarani palpitehelicópteros e as jogavam vivascorinthians e guarani palpitealto mar.

SL: Os ativistas revolucionários que caíram nas mãos do exército tinham pouca chancecorinthians e guarani palpitesobreviver. Que decisão vocês tomaram para tentar salvar alguns deles?
MG: Tivemos a ideiacorinthians e guarani palpitesequestrar o embaixador dos EUA no Brasil e trocá-lo pelos prisioneiros que estavamcorinthians e guarani palpitepiores condições devido aos abusos. Recebíamos informações sobre o estadocorinthians e guarani palpitesaúde deles com bastante regularidade. Também levamoscorinthians e guarani palpiteconta o tamanho e a representatividade dos prisioneiros. Por exemplo, incluímos José Ibrahim, um líder dos trabalhadores que organizou a primeira greve dos metalúrgicoscorinthians e guarani palpiteSão Paulo quando tinha 19 anos, na listacorinthians e guarani palpitequinze pessoas a serem libertadas. Ele conseguiu paralisar todas as fábricas. Foi um grande sucesso, alcançado por um homem muito jovem, que acabaracorinthians e guarani palpitesair da adolescência. Também estava na lista o líder da União Brasileira dos Estudantes. Tínhamos tão pouca experiência que nossa exigência foi limitada a quinze militantes, embora pudéssemos ter exigido um número muito maior, dada a importânciacorinthians e guarani palpitenosso refém. Foi uma ação extremamente imprudente.
SL: Como foi o sequestro?

MG: Eu não estava diretamente envolvida na ação. Foi o Movimento Revolucionário 8corinthians e guarani palpiteOutubro,corinthians e guarani palpiteCarlos Marighela, que realizou a operação. Nós apoiamos o projeto. Em 4corinthians e guarani palpitesetembrocorinthians e guarani palpite1969, prendemos Charles Burke Elbrick. José Dirceu fazia parte do comando. Nós o tratamos com o maior respeito. Não éramos carrascos nem assassinos. Explicamos nossos motivos e depois lhe contamos sobre nossa luta e nossa aspiraçãocorinthians e guarani palpiteconstruir um Brasil diferente, mais justo e soberano, sem os militares no poder. Dadas as circunstâncias, nossas relações com o embaixador durantecorinthians e guarani palpitedetenção foram muito boas. De fato, ele deu uma declaração à imprensa nesse sentido apóscorinthians e guarani palpitelibertação.

A troca ocorreu após uma semanacorinthians e guarani palpitenegociações e os quinze ativistas receberam salvo-condutos para o México antescorinthians e guarani palpiteviajar para Cuba.

SL: Como vocês conseguiram sequestrar uma figura tão importante?

MG: Tivemos o fator surpresa a nosso favor. Hojecorinthians e guarani palpitedia, os embaixadores tomam mais medidascorinthians e guarani palpitesegurança quando viajam, com vários guarda-costas. Isso não acontecia naquela época. O embaixador saíacorinthians e guarani palpiteseu escritório com seu motorista e voltava para casa.

Assim, elaboramoscorinthians e guarani palpiteagenda com detalhes minuciosos, anotando seus horárioscorinthians e guarani palpiteentrada e saída, a rota que ele fazia para chegar à embaixada e,corinthians e guarani palpiteseguida, entramoscorinthians e guarani palpiteação. A operação ocorreu sem problemas e levamos o embaixador para uma casa no bairrocorinthians e guarani palpiteSanta Teresa, nas colinas acima do Riocorinthians e guarani palpiteJaneiro. Esse era o bairro inglês, onde vivia a comunidade britânica.

No entanto, os moradores locais descobriram a presença do comando porque a casa, que até então estava vazia,corinthians e guarani palpiterepente ficou cheia com cercacorinthians e guarani palpitedez pessoas. Mesmo que as precauções tenham sido tomadas, elas não foram suficientes, o que ilustrou nossa inexperiência. O grupo precisava ser alimentado e, quando um dos ativistas saiu para comprar algumas pizzas, voltou com uma quantidade que chamou a atenção dos vizinhos. As autoridades foram alertadas e a maioria dos membros do comando foi presa, enquanto o embaixador foi liberado. Felizmente, a negociação já havia sido feita e os ativistas presos estavamcorinthians e guarani palpitesegurança no México.

A ditadura ficou sem palavras e imaginou que, para conseguir sequestrar o representante da maior potência do mundo, a operação havia sido realizada com o apoiocorinthians e guarani palpiteum aparato militar muito grande. Na realidade, nossas organizações eram modestas e carentescorinthians e guarani palpiterecursos. Mas tínhamos a vontade, e isso era o mais importante.

SL: Como foram as operaçõescorinthians e guarani palpiteguerrilha?

MG: Tínhamos planejado abrir bolsõescorinthians e guarani palpiteguerrilha nas áreas florestais próximas às cidades, enquanto continuávamos nossas operaçõescorinthians e guarani palpitecombate armado nas áreas urbanas. Nossas ações eram mais fáceiscorinthians e guarani palpiteserem executadas na cidade. Assaltamos bancos para obter recursos financeiros e atacamos quartéis para obter armas. O objetivo seguinte era estabelecer uma sólida frentecorinthians e guarani palpiteguerrilha para combater o exército. Essa era a nossa ideia principal.
SL: Em nível pessoal, quais eram suas atividades?
MG: Em primeiro lugar, eu era responsável por investigar as pessoas que recrutávamos para a nossa causa. Depois, quando planejávamos roubar um banco, eu ia até o local para fazer o reconhecimento necessário. Eu contava os minutos que levaria para chegar lá. Entrava no banco para contar o númerocorinthians e guarani palpiteguardas armados presentes e memorizava o layout do local. Por fim, eu informava aos membros da equipecorinthians e guarani palpitecomando. Em nosso grupo, onde o machismo reinava apesarcorinthians e guarani palpitenossas ideias progressistas, as mulheres recebiam as tarefas secundárias nesse tipocorinthians e guarani palpiteação. Por exemplo, eu podia dirigir o carro, mas tinhacorinthians e guarani palpiteficar do ladocorinthians e guarani palpitefora e fazer a vigilância durante o ataque armado. Eu não podia participar porque era considerado muito perigoso para uma mulher. A luta contra o machismo é uma batalhacorinthians e guarani palpitelongo prazo que continua até hoje. As mulheres são fortes e os homens precisam aceitar essa realidade e nos ver como iguais. A sociedade acabará entendendo isso, mesmo que não possamos acabar com séculoscorinthians e guarani palpitedominação masculina da noite para o dia.
SL: Em seguida, você decidiu abrir uma escola. Quais foram suas motivações?

MG: É preciso entender que eu me formei como professora. Trabalhei muito com Paulo Freire e desenvolvi um métodocorinthians e guarani palpiteensino diferente. Sempre gosteicorinthians e guarani palpitenovas formascorinthians e guarani palpiteensinar para facilitar o aprendizado. Comprei uma escola no Riocorinthians e guarani palpiteJaneiro que era um estabelecimento experimental e treinei meus professores lá. Era também o local ideal para nossas atividades. Sempre há muito movimentocorinthians e guarani palpiteuma escola e as visitas regulares dos ativistas não chamavam a atenção das autoridades. Os pais vinham deixar seus filhos e havia muitos funcionários. Era uma cobertura muito boa para nossas atividades.

A escola também serviacorinthians e guarani palpiterefúgio para companheiroscorinthians e guarani palpiteoutras partes do país cujas atividades haviam sido descobertas pela ditadura e que tiveramcorinthians e guarani palpitese esconder. Eu os recebia e lhes oferecia asilo e proteção. Eles então se juntavam ao nosso grupocorinthians e guarani palpiteação no Riocorinthians e guarani palpiteJaneiro. A escola era uma infraestrutura fundamental para os guerrilheiros. Também tínhamos que realizar trabalhoscorinthians e guarani palpiteinformação e propaganda e distribuir literatura revolucionária para conscientizar as pessoas sobre a causa da liberdade. Não podíamos comprar livros. Com outros companheiros, compramos um grande mimeógrafo –corinthians e guarani palpitecerta forma, o precursor da impressora – que pertencia ao Instituto da Malária, que havia falido. Nós o limpamos da forma mais meticulosa possível para que não pudesse ser identificado, mas não foi o suficiente.
SL: O que aconteceu?
MG: Imprimimos documentos que distribuímos entre os militantes. Um dos livros que distribuí foi La guerracorinthians e guarani palpiteguerrilhas,corinthians e guarani palpiteChe Guevara. Ele foi publicadocorinthians e guarani palpiteum momento fundamental na história da América Latina. Em dezembrocorinthians e guarani palpite1968, a escola ia fechar por causa das férias escolares. É claro que não poderíamos suspender nossas atividades e ações militantes, especialmente a guerracorinthians e guarani palpiteguerrilha. Então, decidimos transferir o mimeógrafo para a casacorinthians e guarani palpiteum amigo. Assim, poderíamos continuar nosso trabalhocorinthians e guarani palpiteimpressão. A ideia era levar a máquinacorinthians e guarani palpitevolta para a escola quando as aulas fossem retomadas. Mas houve um incidente. Em fevereirocorinthians e guarani palpite1969, a namorada desse camarada foi presa emcorinthians e guarani palpitecasa e as autoridades descobriram o mimeógrafo e os documentos impressos, ou seja, literatura marxista, considerada subversiva. Havíamos limpado a máquina quando a compramos, mas não havíamos percebido que havia uma pequena placa com as iniciais do Instituto da Malária. A polícia investigou, localizou o vendedor e descobriu que o mimeógrafo havia sido comprado por uma escola. E eu era a diretora e proprietária da escola.
SL: Você foi presa?
MG: Quando soube que meu amigo tinha sido preso e que o mimeógrafo tinha sido encontrado, disse a um membro do nosso grupo, Carlos, que iríamos falsificar uma nota fiscal dizendo que tínhamos vendido o aparelho e que iríamos arquivá-la como prova.

Carlos era um nomecorinthians e guarani palpiteguerra, porque todos nós usávamos nomecorinthians e guarani palpiteguerra por motivoscorinthians e guarani palpitesegurança e não conhecíamos as identidades reais dos militantes, embora, nesse caso, eu soubesse quem ele era. Meu nomecorinthians e guarani palpiteguerra era Miriam e sempre me chamaram assim. É um nomecorinthians e guarani palpiteque gosto muito. Muitas pessoas ainda me chamam pelo meu nomecorinthians e guarani palpiteguerra.

Em marçocorinthians e guarani palpite1969, pouco antes do início das aulas – no Brasil, as férias escolares começamcorinthians e guarani palpitedezembro e terminam depois do Carnaval – , eu estava no meiocorinthians e guarani palpiteuma reunião com meus professores quando,corinthians e guarani palpiterepente, o exército invadiu a escola. Nunca vou me esquecer desse momento. Os soldados chegaram à porta com um documento verde e amarelo que era um mandadocorinthians e guarani palpiteprisão contra mim. Eu disse ao oficial o quanto estava surpresa. “Você é uma subversiva e comunista”, ele respondeu. Eu lhe disse que ele estava com a pessoa errada. Ele me falou sobre o mimeógrafo e os documentos marxistas. Neguei categoricamente e continuei com a minha história: eu havia vendido a câmera alguns meses antes e mostrei a ele o recibo.

Eles queriam levar o recibo com eles, mas eu me opus, explicando que não tinha outra cópia. O oficial queria que eu os acompanhasse imediatamente ao Ministério da Guerra. Eu me opus, dizendo que não poderia me apresentar a tal autoridade sem estar vestido adequadamente. Eu estava tentando ganhar tempo. Eles finalmente aceitaram meu pedido e foram embora.

SL: O que você fezcorinthians e guarani palpiteseguida?
MG: Saí da escola e tentei apagar meus rastros. Tinha medocorinthians e guarani palpiteser seguido. Finalmente voltei para casa, peguei meus dois filhos, Marcello e Eduardo, que tinham três e dois anos, respectivamente, e me escondi. Minha organização precisavacorinthians e guarani palpitedinheiro e muitoscorinthians e guarani palpitenós já estávamos vivendo na clandestinidade. Depoiscorinthians e guarani palpiteuma análise cuidadosa, nosso líder, Juarez, o comandante da VPR – o homem que me deu meu nomecorinthians e guarani palpiteguerra, Miriam – me aconselhou a procurar as autoridades e dizer a elas que eu não tinha nada a ver com os movimentos revolucionários. Havia um risco, mas ele conhecia bem minha personalidade e estava convencidocorinthians e guarani palpiteque eu seria persuasivo. Os outros companheiros se opuseram ferozmente à ideia devido ao perigocorinthians e guarani palpiteserem presos, torturados ou até assassinados. Mas, no final, Juarez conseguiu impor seu pontocorinthians e guarani palpitevista. É verdade que muitoscorinthians e guarani palpitenossos companheiros estavam escondidos e não tínhamos dinheiro suficiente para sustentá-los. É preciso muito dinheiro quando se vive na clandestinidade. Cercacorinthians e guarani palpiteum mês depois, fui ao Ministério da Guerra.
SL: Como você foi recebida?

MG: O exército não esperava minha visitacorinthians e guarani palpiteforma alguma. Várias semanas depois, eu apareci e disse que não tinha nada a ver com isso. Eu tinha uma boa desculpa para minha ausência: o pai dos meus filhos estava doente e eu tinha que cuidar da minha família. De fato, como medidacorinthians e guarani palpiteprecaução, meus filhos não estavam mais no Rio. Eu os havia levado para outro lugar, para Minas, para ficar com minha irmã.

Fui interrogada por 72 horascorinthians e guarani palpitecondições muito difíceis. Eles se revezavam para me fazer as mesmas perguntas e tentar encontrar uma brechacorinthians e guarani palpiteminha história.

Durante o interrogatório, mostraram-me fotoscorinthians e guarani palpitemeus companheiros mortos, que haviam sido brutalmente torturados, e minhas reações foram cuidadosamente observadas. Uma das fotos que me foi mostrada era do companheiro que havia comprado o mimeógrafo comigo e que havia sido detido e assassinado pela ditadura. Mostraram-me uma fotocorinthians e guarani palpiteseu corpo estrangulado e mutilado. A imagem era insuportável. Foi extremamente difícil para mim manter o controlecorinthians e guarani palpiteminhas emoções. Para poder resistir psicologicamente à detenção, pensei no Che e tentei extrair a força necessáriacorinthians e guarani palpiteseu exemplo. Mas por dentro eu estava completamente destruída.

SL: Você foi submetida a violência física?
MG: Um dos soldados, armado com uma faca, aproximou-secorinthians e guarani palpitemim com a intençãocorinthians e guarani palpitecortar meu peito. Felizmente, umcorinthians e guarani palpiteseus colegas interveio e conseguiu dissuadi-lo, lembrando-ocorinthians e guarani palpiteque eles não tinham provascorinthians e guarani palpiteque eu era um agente da subversão. Eles não sabiam se eu era diretora e proprietáriacorinthians e guarani palpiteuma escola burguesa, o que era verdade, ou se eu era um ativista revolucionária, o que também era o caso.

Felizmente, consegui semear a dúvidacorinthians e guarani palpitesuas mentes e finalmente consegui suportar a provação sem vacilar. Mas um dos soldados presentes não acreditoucorinthians e guarani palpiteminha versão dos fatos nemcorinthians e guarani palpiteminha inocência. Ele continuou dizendo que eu estava falando bobagem e que não estava dizendo a verdade. Então, eles decidiram me colocarcorinthians e guarani palpiteuma prisãocorinthians e guarani palpiteLa Pedrera. Mas como não tinham nenhuma prova concreta, decidiram me soltar nas primeiras horas da manhã e me levaramcorinthians e guarani palpitevolta ao Riocorinthians e guarani palpiteum pequeno barco.

Dei a volta no Rio para me certificarcorinthians e guarani palpiteque não estava sendo seguido e passei longas horas na praia pensandocorinthians e guarani palpiteminhas ações futuras. Finalmente, fui para um esconderijo que havíamos montado para o casocorinthians e guarani palpiteuma emergência e lá encontrei Juarez, que estava me esperando há vários dias. Ele estava eufórico e me dizia que sabia que os militares cairiam na armadilha e acreditariam na minha história. O paicorinthians e guarani palpitemeus filhos me disse para ir para casa, mas eu me recusei.

SL: Por que você fez isso?

MG: Eu sabia que os militares não tinham acreditadocorinthians e guarani palpiteminha história. Eu tinha conseguido incutir dúvida suficiente para que eles me libertassem, mas eles ainda desconfiavam muitocorinthians e guarani palpitemim. Portanto, era muito perigoso para mim voltar para casa. Então, decidi ir para a casa da irmã dele, mas o exército já estava lá me procurando. No dia seguinte à minha libertação, os soldados prenderam a pessoa que havia nos vendido o mimeógrafo, que me identificou positivamentecorinthians e guarani palpiteuma das fotos. Ele também identificou o companheiro que me acompanhava e que havia sido morto pelo exército. Agora eles tinham uma prova concreta com esse testemunho. Tive muita sorte porque meu destino foi decididocorinthians e guarani palpite24 horas.
SL: Foi então que você se tornou clandestina.

MG: Sim, por quase um ano vivi escondida. Foi uma época muito difícil. Saícorinthians e guarani palpitecasa às pressas, sem levar nada comigo, sem dinheiro. Tive que ficar sozinha, não me comunicar com ninguém e ser o mais discreta possível, porque meu retrato estava espalhado por toda partecorinthians e guarani palpitecartazescorinthians e guarani palpiteprocurado. Eu tinha que sair disfarçada. Às vezes, minha única refeição do dia era um pedaçocorinthians e guarani palpitepão. Eu morava na favela. Passava noites inteiras dormindocorinthians e guarani palpitemeu carro na beira da estrada. Às vezes, dormia na casacorinthians e guarani palpiteamigos, no porão, mas não podia ficar com a mesma pessoa por maiscorinthians e guarani palpiteum dia por motivoscorinthians e guarani palpitesegurança. Era uma vida insuportável.

Além disso, eu tinha dois filhos pequenos, o que complicava ainda mais a situação. Meus filhos estavam com fome e precisavam sair para brincar. A vida na clandestinidade não é para crianças. Marcello ficou doente e não pude levá-lo ao médico. O anocorinthians e guarani palpite1969 se passou assim e eu não conseguia encontrar uma solução que mantivesse as crianças seguras. Eu estava sempre mudandocorinthians e guarani palpitecidade ecorinthians e guarani palpiteestado. Estavacorinthians e guarani palpiteum beco sem saída, à beiracorinthians e guarani palpiteum abismo, e sabia que, mais cedo ou mais tarde, se não tomasse uma decisão radical, cairia nas garras da ditadura. Não se passava uma semana sem que companheiros fossem capturados e assassinados.

A tomadacorinthians e guarani palpitereféns e o sequestro do avião

SL: Então você decidiu sequestrar um avião comercial e deixar o país. Por que escolheu se exilarcorinthians e guarani palpiteCuba e não na França, por exemplo?

MG: Apesar da minha situaçãocorinthians e guarani palpitemulher casada e com dois filhos, depoiscorinthians e guarani palpiteum ano vivendo ilegalmente, onde cada dia poderia ser o último, eu não conseguia me ver indo para a Europa. Embora estivesse preparada para dar minha vida pela revolução no Brasil, não poderia ir para um país ocidental e abandonar a causa da luta pela emancipação. Cuba estavacorinthians e guarani palpitemeio a um processo revolucionário e achei que poderia dar minha modesta contribuição à luta daquele povo pela dignidade humana. Eu era uma professora com experiênciacorinthians e guarani palpiteeducação. A música e a literatura brasileiras são extremamente ricas e tive a sortecorinthians e guarani palpiteter recebido uma excelente educação. O que eu teria feitocorinthians e guarani palpiteParis? Então, eu queria ser útilcorinthians e guarani palpiteCuba. Queria dar estabilidade aos meus filhos e sabia que encontraria isso na ilha, onde o bem-estar das crianças é uma prioridade nacional. Em nenhum país capitalista meus filhos poderiam ter desfrutadocorinthians e guarani palpitetamanha estabilidade emocional.
SL: Como foi o desenvolvimento da operação?
MG: Após uma análise cuidadosa, todos nós chegamos à conclusãocorinthians e guarani palpiteque a única solução era deixar o Brasil. Então, viajeicorinthians e guarani palpiteônibus para Porto Alegre, no sul do país, parandocorinthians e guarani palpitecada estado por uma noite para cobrir meus rastros. Uma vez lá, meus companheiros e eu começamos a preparar a estratégia para essa operação arriscada. Mas, para poder cumprir essa missão, tivecorinthians e guarani palpiteconfiar meus filhos Marcello e Eduardo a alguém para que eu pudesse trabalharcorinthians e guarani palpiteboas condições.

SL: Foi nesse momento que você conheceu uma jovem ativista chamada Dilma Rousseff, que viria a se tornar a primeira mulher presidente do Brasil.

MG: Dilma tinha apenas 22 anos e eu nunca a havia conhecido antes. Ela veio buscar as criançascorinthians e guarani palpiteuma noite e cuidou do Marcello e do Eduardo, que eram muito jovens, por quase duas semanas.

Permita-me fazer um comentário sobre ela como pessoa. Algumas pessoas que trabalharam com a Dilma dizem que ela tem uma personalidade muito forte e que às vezes é difícil conversar com ela. Eu tenho uma opinião completamente oposta sobre ela. A Dilma é infinitamente carinhosa. Imaginem a situação. Meus filhos estiveram constantemente comigo por quase um ano enquanto estávamos escondidos. De um dia para o outro, eles eram separados da mãe e deixados para passar quinze dias com uma jovem desconhecida. Quando os vi novamente após duas semanas, eles ficaram muito felizes, apesar da minha longa ausência, com a qual não estavam acostumados. Duas semanas é um tempo muito longo para duas crianças separadas da mãe, o que prova que a Dilma é uma pessoa especial, com muita bondade e generosidade, porque as crianças nunca se enganam sobre as pessoas. A Dilma tinha sido uma ótima mãe substituta, cuidando tão bem dos meus filhos que eles conseguiram aceitar minha ausência sem grandes dificuldades. A presençacorinthians e guarani palpiteuma mãe é muito importante, especialmente para crianças pequenas. Marcello e Eduardo, que agora são adultos, ainda adoram Dilma, não a Dilma que é presidente, mas a Dilmacorinthians e guarani palpite22 anos que cuidou deles quando eram crianças vulneráveis, marcadas pela clandestinidade e separadas da mãe. Para eles, Dilma será sempre a menina que lhes deu amor e proteçãocorinthians e guarani palpiteum momento difícilcorinthians e guarani palpitesua infância.

SL: Quantas pessoas estavam envolvidas no sequestro do avião?

MG: Atravessamos a fronteira para Montevidéu, no Uruguai. Éramos quatro no início, depois seis, porque o líder do comando, Andrada, decidiu incluir dois outros companheiros, que não faziam parte da nossa organização e cuja presença não estava planejada. No total, com meus dois filhos, éramos oito. Os Tupamaros nos alojaram por um tempocorinthians e guarani palpiteuma casa e depois fomos para um hotel até o grande dia. Como eu tinha dois filhos e muita bagagem, fiquei encarregadacorinthians e guarani palpitelevar as armas para o avião. Naquela época, não havia as medidascorinthians e guarani palpitesegurança que existem hoje nos aeroportos. Eu era muito magra e havia comprado um vestido muito grande para esconder o arsenal. Sentei-me na partecorinthians e guarani palpitetrás do avião com Marcello e Eduardo, para protegê-los e evitar que um passageiro os pegassecorinthians e guarani palpiteum momentocorinthians e guarani palpitepânico. Uma vez a bordo, Andrada foi falar com o capitão para pedir-lhe que desviasse a rota para Cuba. O capitão, que era muito experiente, foi muito profissional e cooperativo. Ele informou os passageiros sobre a situação e pediu que mantivessem a calma. Porém, depois que entramos no avião, ele nos disse que não era possível chegar a Cuba porque o tempocorinthians e guarani palpitevoo eracorinthians e guarani palpiteapenas duas horas. Além disso, havia o fatocorinthians e guarani palpiteque nenhumcorinthians e guarani palpitenós tinha o mínimo conhecimentocorinthians e guarani palpiteaviação. Eles poderiam ter nos levado para a Antártica e não saberíamoscorinthians e guarani palpitenada.
SL: Como vocês conseguiram chegar a Cuba naquelas condições?
MG: Nossa grande sorte foi que encontramos um capitão que já havia passado por uma experiência semelhante. Ele já havia sido feito refém por um grupo que queria ir para Cuba. Portanto, ele foi muito cooperativo e tranquilo, o que facilitou nosso trabalho. Garantimos a ele que o avião iria para Cubacorinthians e guarani palpiteuma forma oucorinthians e guarani palpiteoutra. Foi uma longa viagem. Primeiro fomos para Buenos Aires, na Argentina. Depois, fomos para Antofagasta. Do Chile, decolamos para o Peru. A situação no Peru se tornou muito complicada. O Ministro das Relações Exteriores do Peru foi até a pista do aeroporto para tentar nos convencer a sair do avião. Naquela época, o governo militar revolucionáriocorinthians e guarani palpiteJuan Velasco Alvarado estava no poder. O ministro me ofereceu asilo político para mim e meus dois filhos.

Tranquilizei meus companheiros e disse-lhes que não os abandonaria, apesar da insistência do ministro, que veio me ver nada menos que três vezes. No final, fomos autorizados a partir, depoiscorinthians e guarani palpiteconsertar um problema com nossas hélices. Em seguida, decolamos para o Panamá. Lá, a situação era tensa porque as autoridades haviam dado secretamente uma arma ao capitão que havia descido para que ele a usasse contra nós, criando pânico e incentivando um ataque ao avião. Mas, felizmente, mesmo que ele tivesse aceitado a arma, recusou-se a usá-la contra nós, pois isso teria causado uma tragédia.

Descobri tudo isso 30 anos depois, quando vi o comandante novamente na apresentaçãocorinthians e guarani palpitemeu livro no Riocorinthians e guarani palpiteJaneiro. Ele havia feito um chaveiro com uma balacorinthians e guarani palpiterevólver e me contou toda a história.

Exíliocorinthians e guarani palpiteCuba

SL: Como você foi recebida quando chegou a Cuba?

MG: Devo dizer que devo minha vida aos jornalistas que divulgaram esse casocorinthians e guarani palpitetodo o mundo e que acompanharam nossa viagem a Cuba, principalmente porque meus filhos estavam lá. Tornou-se impossível para as forças armadas dos vários países pelos quais passamos invadir a aeronave. Ninguém queria assumir a responsabilidade por qualquer tragédia que pudesse ocorrer com a presençacorinthians e guarani palpitemeus filhos. Portanto, tenho uma dívidacorinthians e guarani palpitegratidão com os jornalistascorinthians e guarani palpitegeral.

Não tínhamos nenhum conhecimentocorinthians e guarani palpiteaviação. A única coisa que eu sabia era que o aeroportocorinthians e guarani palpiteHavana tinha o nomecorinthians e guarani palpiteJosé Martí. Três soldados uniformizados e armados com metralhadoras entraram no avião e perguntaram onde estava “a mulher com as duas crianças”. Na época, eu falava muito pouco espanhol.

Eu estavacorinthians e guarani palpiteum estado físico e psicológico crítico, pois havíamos passado três dias sem comida ou água. Temíamos que a comida pudesse estar contaminada por alguma substância. Meus filhos conseguiram comer graças à comida que eu havia levado comigo. Estávamos todos muito fracos. Olhando para trás, acho que quando você está determinado a fazer algo que é vital para você ecorinthians e guarani palpitefamília – nesse caso, salvar nossas vidas e especialmente as dos meus filhos – você consegue encontrar a energia necessária para fazer o trabalho.

Quando cheguei ao corredor para descer do avião, lembro-mecorinthians e guarani palpiteter visto uma imensidão verde. Ao redor do avião havia soldadoscorinthians e guarani palpitetrajes militares. Eu estava carregando meus filhos nos braços e, quando passei por um soldado, ele acariciou a cabeçacorinthians e guarani palpiteEduardo. Foi nesse exato momento que eu soube que estava realmentecorinthians e guarani palpiteCuba. Consegui liberar toda a pressão que havia acumulado desde o início da operação, porque finalmente me senti segura.

SL: O que aconteceu depois?

MG: Fomos separados e as autoridades nos informaram que Cuba não aceitava sequestradores. Foi uma grande surpresa para nós. O que eu ia fazer com meus dois filhos? Disseram-nos que o governo mexicano seria contatado para nos acolher. Eu me opus a isso. Após uma longa discussão, os cubanos finalmente me disseram que eu poderia ficar na ilha com meus filhos, mas que meus amigos teriamcorinthians e guarani palpiteir para o México. corinthians e guarani palpite Mais uma vez, expressei minha firme oposição a essa ideia, enfatizando que não estava abandonando meus companheiros no caminho. Acho que eles se reconheceram nesses princípios, porque os cubanos nunca abandonam os seus no campocorinthians e guarani palpitebatalha. Houve uma reuniãocorinthians e guarani palpiteEstado, com a presençacorinthians e guarani palpiteFidel, e eles concordaramcorinthians e guarani palpitenos dar asilo político.

SL: Como foram os primeiros mesescorinthians e guarani palpiteCuba?
MG: Os primeiros meses foram bastante difíceis porque você tinhacorinthians e guarani palpitese adaptar a uma nova sociedade, mas a atmosfera era bastante calma. Morei no Hotel Capri com meus filhos durante um ano inteiro. Apesarcorinthians e guarani palpitetermos ficado na suíte presidencial, que era muito grande, a vida não foi fácil porque o local não foi projetado para acomodar crianças pequenas por um período tão longo. corinthians e guarani palpite Mais tarde, nos mudamos para um apartamento no bairrocorinthians e guarani palpiteMiramar.
SL: Quais foram seus primeiros encontros na ilha?
MG: A primeira pessoa que conheci foi Luís Travassos, que havia sido libertado na troca com o embaixador americano.

Conheci Roque Dalton, o poeta e revolucionário salvadorenho. Ficamos amigos rapidamente. Ele também tinha dois filhos e lembro que trouxe uma sacola cheiacorinthians e guarani palpitebrinquedos para Marcello e Eduardo.

Marta Solís, uma jornalista mexicana que trabalhava para a Revista Siempre, foi outro grande encontro. Duas semanas após minha chegada, ela me convidou para ir àcorinthians e guarani palpitecasa. Ela moravacorinthians e guarani palpiteum apartamento perto do Capri. Quando cheguei, um homem negro enorme abriu a porta com um grande sorriso. Ele não falava português e eu não falava espanhol. Ele sabia que eu era a “mulher do avião com duas crianças pequenas”. Ele me disse que adorava a cantora brasileira Elis Regina. Esse era Pablo Milanés.
SL: Fale-nos sobre Pablo Milanés.
MG: Conversamos muito sobre música quando nos conhecemos. Quando estávamos nos despedindo, Pablo me disse: “Sou o primeiro a me inscrever no movimento guerrilheiro brasileiro. Me coloque na lista”. Daquele momentocorinthians e guarani palpitediante, nasceu uma grande amizade entre nós que durou atécorinthians e guarani palpitemorte recente. Eu sempre o chameicorinthians e guarani palpitePablito. Ele me ajudou muito com as crianças. Ele as buscava na escola. Preparava suas mamadeiras. Cuidava delas quando estavam doentes. Ele era um membro da família. Estávamos juntos o tempo todo. Ele não era um rebelde, mas estava ciente da realidade do mundo. Ele criticava a política culturalcorinthians e guarani palpiteCuba e não hesitavacorinthians e guarani palpitedizer isso pessoalmente. Escreveu algumas das mais belas canções da Nueva Trova. Divulgou a música cubanacorinthians e guarani palpitetodo o mundo e fez a Revolução brilhar. Yolanda é agora um hino internacional. Ele desempenhou um papel fundamental na aberturacorinthians e guarani palpiteseu país. Ele tinha um grande amor por Cuba.

SL: Você também conheceu Silvio Rodríguez, que até dedicou uma música a você.

MG: Silvio tem uma personalidade completamente diferente dacorinthians e guarani palpitePablito. Ele é muito tímido. Ele escreve músicas maravilhosas. Sua devoção à Revolução Cubana é inigualável. Eu amo muito o Silvio. Ele é como um irmão para mim.

Quanto à música, a história é a seguinte: Silvio e Vicente Feliú precisavam comporcorinthians e guarani palpiteum lugar tranquilo porque, devido àcorinthians e guarani palpitefama, eram constantemente assediados por fãs que pediam autógrafos. Então, eu lhes emprestava regularmente meu apartamento. Quando eles vinham trabalharcorinthians e guarani palpiteminha casa, eu ia com meus filhos para a casacorinthians e guarani palpiteoutra amiga mexicana chamada Bertha, onde eu tinha um quarto à minha disposição.

Certa noite, depoiscorinthians e guarani palpitedeixar meu apartamento para eles, fui buscar algumas roupas. Eu estava sentindo saudades e sentia muita falta do Brasil. Silvio me perguntou o que estava acontecendo e eu expliquei como me sentia. Embora eu estivesse felizcorinthians e guarani palpiteCuba e tivesse muitos amigos lá, sentia faltacorinthians e guarani palpiteminha terra natal. Lembro-mecorinthians e guarani palpiteter dito ao Silvio: “Sua lua é diferente da minha. Não é a mesma. A minha é maior”. Silvio, surpreso, retrucou: “Como assim,corinthians e guarani palpitelua é maior? A lua é a mesmacorinthians e guarani palpitetodo lugar!” Eu não podia discutir. É uma questãocorinthians e guarani palpitelatitude. Essa diferençacorinthians e guarani palpitelatitude tem um impacto sobre o corpo. O cheiro do mar também era diferente. O Silvio ficava me dizendo: “Mas Miriam, do que você está falando?

Meus amigos cantores faziamcorinthians e guarani palpitetudo para me deixar feliz. Por exemplo, o grupo Manguaré aprendeu dezenascorinthians e guarani palpitemúsicas brasileiras e, toda vez que eu ia a umcorinthians e guarani palpiteseus shows, eles cantavamcorinthians e guarani palpiteportuguês. Os exilados chilenoscorinthians e guarani palpiteCuba não acreditavamcorinthians e guarani palpiteseus olhos. Então, conversei um pouco com Silvio e os cantorescorinthians e guarani palpitemeu apartamento, e ele me pediu para ir descansar: “Vá dormir, senão você vai passar a noite toda conversando com a gente sobre a lua e o mar”. No dia seguinte, eu ainda estava dormindo quando senti alguém tocar meu pé. Era o Silvio: “Acorde, vou cantar algo para você”. Era Pequeña serenata diurna, uma música magníficacorinthians e guarani palpiteritmocorinthians e guarani palpitesamba-canção. Também me lembro que, há alguns anos, Silvio organizou um showcorinthians e guarani palpiteSan Antoniocorinthians e guarani palpitelos Baños, a cidade onde ele nasceu, e eu estava lá. Ele cantou todas as minhas músicas favoritas. Lembro que estava chovendo muito e era um show ao ar livre. A última música que ele cantou foi Pequeña serenata diurna e ele me fez subir ao palco para cantá-la com ele. Foi magnífico. Augusto Blanca também me dedicou uma bela canção chamada No olvides que una vez tú fuiste sol. Para dizer a verdade, acho que não mereço tal honra.
SL: Você conheceu outros cantores cubanos.

MG: Conheci o Noel Nicola e me apaixonei por ele. Bem, não me apaixonei por Pablito, que era muito bonito, mas por Noel Nicola, que não era muito bonito, para dizer o mínimo. As pessoas o apelidaramcorinthians e guarani palpite“Drácula”. Mas ele tocava guitarra como ninguém e ficamos apaixonados por muito tempo.

corinthians e guarani palpite Mais tarde, conheci todos os cantores da Nueva Trova, na casacorinthians e guarani palpiteMarta ou na ICAIC. Conheci Sara Gonzalez, Sergio Vitier e Leo Brower porque todos eles faziam partecorinthians e guarani palpiteum grupocorinthians e guarani palpiteexperimentação sonora. Passei a fazer parte do mundo da Nueva Trova, apesarcorinthians e guarani palpitenão tocar nenhum instrumento e cantar desafinado. Tenho muito orgulho disso.

Esses jovens têm desempenhado um papel fundamentalcorinthians e guarani palpiteCuba. Como você sabe, a ilha sofre com um bloqueio brutal e desumano que afeta todos os setores da sociedade, inclusive a cultura. A partir da décadacorinthians e guarani palpite1970, os trovadores começaram a ser convidados a se apresentarcorinthians e guarani palpitetodo o mundo, na França, na Itália e na União Soviética, e isso levou a um graucorinthians e guarani palpiteabertura.

Na décadacorinthians e guarani palpite1960, Fidel havia dito que Cuba seria necessariamente um paíscorinthians e guarani palpiteconhecimento, pensamento e cultura. Por isso, criamos o Instituto Cubanocorinthians e guarani palpiteArtes e Indústria Cinematográfica, a Casacorinthians e guarani palpitelas Américas, a União Nacionalcorinthians e guarani palpiteEscritores e Artistascorinthians e guarani palpiteCuba, a Uniãocorinthians e guarani palpiteJornalistascorinthians e guarani palpiteCuba, enquanto construíamos uma nova sociedade.

SL: Como era a vidacorinthians e guarani palpiteCuba?

MG: Em comparação com os países capitalistas, Cuba estava atrasadacorinthians e guarani palpitetermos materiais. Mas no campo da educação, por exemplo, Cuba era uma nação muito avançada. Descobri uma sociedade totalmente diferente, com o trabalho voluntário que havia sido criado por Che. O trabalho voluntário acontecia no fimcorinthians e guarani palpitesemana, depoiscorinthians e guarani palpiteuma semana inteiracorinthians e guarani palpitetrabalho comum. Lembro-me das pessoas cantando enquanto se amontoavamcorinthians e guarani palpitecaminhões aos domingos para cortar cana-de-açúcar. Era a época da colheitacorinthians e guarani palpite“10 milhões”. O objetivo era produzir 10 milhõescorinthians e guarani palpitetoneladascorinthians e guarani palpiteaçúcar. Eu desfrutavacorinthians e guarani palpitetotal liberdadecorinthians e guarani palpiteCuba. Por exemplo, eu queria que as crianças nas creches pudessem ouvir música clássica na hora das refeições e antes da sesta. Essa era minha grande aspiração. Eu queria que as crianças das escolas maternais, primárias e secundárias tivessem acesso à música. Então, fui ao Ministério da Educação e pedi uma audiência com o ministro, que era José Ramón Fernández, o Gallego, como era conhecido. Ele me recebeu e eu lhe expliquei meu projeto. Ele me disse que Cuba não tinha recursos para oferecer música clássicacorinthians e guarani palpitetodas as creches do país. Sugeri que ele fizesse uma experiência na creche onde Marcello e Eduardo estavam. Foi um grande sucesso. Posteriormente, Silvio, Pablito, Nicola, Sara e os outros cantores deram aulascorinthians e guarani palpitemúsicacorinthians e guarani palpiteescolas.
SL: Naquela época, Cuba era um paraíso para revolucionários e exilados políticoscorinthians e guarani palpitetodo o mundo. Quem você conheceu na ilha?
MG: Conheci muitos camaradascorinthians e guarani palpitetodo o mundo. Meu encontro com Amílcar Cabral e Luís Cabral, os líderes revolucionárioscorinthians e guarani palpiteGuiné Bissau e Cabo Verde, deixou uma profunda impressãocorinthians e guarani palpitemim. Conheci Amílcar Cabral na cafeteria do Hotel Capri no primeiro anocorinthians e guarani palpiteminha estadacorinthians e guarani palpiteCuba. Eu não sabia quem ele era. Ele me encarou com tanta intensidade que fiquei com medo. Eu tinha acabadocorinthians e guarani palpitechegar à ilha, ainda com as cicatrizescorinthians e guarani palpitemeu ano na clandestinidade, e me perguntei se ele não seria um agente secreto. Eu via inimigos por toda parte. Então, saí rapidamente da cafeteria, peguei o elevador e subi para o meu quarto. Mas ele me seguiu e pegou o elevador também! Ele me perguntoucorinthians e guarani palpiteportuguês: “De onde você é?” Respondi: “De Portugal”, com meu sotaque brasileiro! Ele continuou: “Você conhece o hospital Santa María?” Comecei a entrarcorinthians e guarani palpitepânico. Eu não tinha sotaque português e não conhecia Portugal. Então respondi: “Não, moro no Brasil desde pequena”. Assim que as portas do elevador se abriram, fugi rapidamentecorinthians e guarani palpitevolta para o meu quarto. Mas ele parou no mesmo andar que eu! E entrou no quarto ao lado do meu! Pensei comigo mesma: “Meu Deus, esse cara está aqui para nós e vai machucar meus filhos. Estamos perdidos”. Eu estava andandocorinthians e guarani palpiteum lado para o outro no meu quarto, pensando no que fazer, quandocorinthians e guarani palpiterepente o telefone tocou. Era José Ibrahim. Ele me pediu para descer, pois queria que eu me encontrasse com uma pessoa. Entrei no saguão do hotel e o encontrei com... Amílcar Cabral!

Depois que as apresentações foram feitas, contei a eles toda a história e Amílcar riu muito. Imagine confundir esse líder revolucionário com um agente da CIA! Foi muito engraçado. Nós nos abraçamos e nos tornamos grandes amigos. Lembro que ele me deu um conselho: “Nunca mais diga que você vemcorinthians e guarani palpiteum lugar que não conhece”.

Ele então voltou para Angola e mantivemos contato regular até seu assassinato pelo serviço secreto portuguêscorinthians e guarani palpite1973. Passávamos noites inteiras juntos conversando sobre revolução, anticolonialismo, a libertação da África e como poderíamos mudar o mundo. Aprendi a falar cabo-verdiano. Aprendi muitas músicascorinthians e guarani palpitesua terra natal. Foi um encontro inesquecível.

SL: Fale-nos sobre Luís Cabral, o primeiro presidente da Guiné-Bissau ecorinthians e guarani palpiteCabo Verde.

MG: Luís era um jornalista que trabalhava na UPEC. Depois, juntou-se à guerrilha na Guiné-Bissau. Um dia, durante umacorinthians e guarani palpitenossas reuniões, eu lhe disse que ele seria o Presidente da República. Ele riu muito e retrucou: “Vocês brasileiros têm esse hábitocorinthians e guarani palpitesempre tentar prever o futuro”. E acrescentou que, se um dia isso acontecesse, ele me ligaria pouco antes da posse e viria me vercorinthians e guarani palpiteCuba. Na época, a luta anticolonial contra Portugal estavacorinthians e guarani palpitepleno andamento, e as perspectivascorinthians e guarani palpitelibertação não eram óbvias. Um dia,corinthians e guarani palpite1973, o telefone tocou e era o Luís. Eu o reconheci imediatamente por seu sotaque. Pensei que ele estivessecorinthians e guarani palpiteHavana e quisesse me ver. Mas ele me disse que estavacorinthians e guarani palpitecasa e que estava prestes a ser nomeado presidente. “Eu mantive minha palavra”, ele me disse. Cercacorinthians e guarani palpitedois anos depois, ele veio a Havana. Eu estavacorinthians e guarani palpitemeu apartamento quando Marcello e Eduardo chegaram e me disseram que havia muitos carros pretos do ladocorinthians e guarani palpitefora do prédio. Era o Luís. Passamos várias horas conversando e rindo. Foi um momento extraordinário.
SL: Em Cuba, você também conheceu Rogério Paulo, o grande diretor e fundador do Partido Comunista Português.

MG: Rogério Paulo estava exiladocorinthians e guarani palpiteCuba porque foi perseguido pela ditaduracorinthians e guarani palpiteSalazarcorinthians e guarani palpitePortugal. Ele se hospedou no mesmo hotel que eu. Ele tinha dois filhos. Sete ou oito anos depois, casei-me com umcorinthians e guarani palpiteseus dois filhos, Rui Ferreira. Lembro que minha mãe era contra nosso casamento. Mas continuamos amigos íntimos até hoje.

SL: Você era membro dos Comitêscorinthians e guarani palpiteDefesa Revolucionária. Poderia nos contar sobre suas atividades dentro dessa organização?

MG: Os CDRs são organizadoscorinthians e guarani palpitetodos os bairroscorinthians e guarani palpiteCuba. Eles surgiram no início da décadacorinthians e guarani palpite1960 como uma resposta aos ataques terroristas orquestrados por oponentes apoiados pela CIA. Dentro dessa estrutura, há um presidente, um coordenadorcorinthians e guarani palpitesaúde e um coordenador ideológico, eleitos a cada ano.

Por muitos anos, fui o coordenadorcorinthians e guarani palpitesaúde do CDRcorinthians e guarani palpitemeu bairro. Minha função era verificar se todos os moradores eram vacinados, se as mulheres grávidas eram monitoradas adequadamente e se as pessoas vulneráveis recebiam a atenção e os cuidados necessários. Minha função também era lançar campanhascorinthians e guarani palpiteprevenção sobre questõescorinthians e guarani palpitesaúde e proteger os grupos mais vulneráveis. Eu também tinha a funçãocorinthians e guarani palpiteassistente social e psicólogo. Se um morador local descobria que estava sofrendocorinthians e guarani palpiteuma doença grave, nós o encaminhávamos para serviços especializados e lhe dávamos apoio moral.

Cuba alcançou a excelência no campo da saúde, com resultados excepcionais para um país do Terceiro Mundo sob sanções econômicas. O modelo baseado na prevenção é o melhor do mundo.

Eu também estava muito envolvidacorinthians e guarani palpitetodas as questões educacionais. Também nos certificamoscorinthians e guarani palpiteque todas as crianças fossem à escola adequadamente e prestamos muita atenção à questão do absenteísmo. De fato, fundei a Escola para pais para conscientizar os adultos sobre as novas formascorinthians e guarani palpiteeducação. Por exemplo, alguns pais eram violentos com seus filhos, pensando que o castigo corporal fazia parte da educação. Eles próprios haviam sido educados dessa forma. Portanto, tivemos que fazer um grande trabalho educacional para convencê-loscorinthians e guarani palpiteque a violência era traumática e contraproducente. As crianças nascem para serem felizes, como disse José Marti, e a infância deve ser um santuário. Não foi uma tarefa fácil. Foi uma tarefacorinthians e guarani palpitelongo prazo. Hoje, Cuba resolveu esse problema e a educação também tem um padrão muito alto sob todos os pontoscorinthians e guarani palpitevista.

SL: Você também criou a cátedracorinthians e guarani palpiteportuguês na Universidadecorinthians e guarani palpiteHavana.

MG: Como eu era professoracorinthians e guarani palpiteportuguês, criei essa cátedra, que não existiacorinthians e guarani palpiteCuba. Havia professores da França, da Itália ecorinthians e guarani palpiteoutros países que faziam o mesmo com seus respectivos idiomas.

Tenho uma anedota engraçada sobre isso. O tradutor oficial do Comitê Central do Partido Comunista Cubano foi meu aluno. Toda vez que encontro Pulgaron, ele me aplaudecorinthians e guarani palpitepé. Pulgaron é enorme. Ele é ainda mais alto que Fidel. Hoje ele é o intérprete do presidente Miguel Diaz-Canel. Ele é poliglota e fala seis idiomas. Eu o vicorinthians e guarani palpiteminha última visita a Cuba. Havia várioscorinthians e guarani palpitenós e Pulgaron exclamou: “Miriam é a melhor professora que já tive. Nunca vou me esquecer dela. Sabe por que nunca perdi nenhumacorinthians e guarani palpitesuas aulas? Se você visse as pernas dela!” Como eu era brasileira, usava minissaia com frequência. Foi um momento muito engraçado.

SL: Você também trabalhou na Rádio Havana como locutor.

MG: A locutora portuguesa da Rádio Havana, que era casada com um diplomata cubano, teve um problemacorinthians e guarani palpitesaúde e precisou ficarcorinthians e guarani palpiteconvalescença por seis meses. Então, fui chamada para substituí-la. Eu não tinha experiência nessa área, mas me disseram que era uma tarefa revolucionária. Então aceitei o trabalho e, felizmente, apesarcorinthians e guarani palpiteminha voz não ser adequada ao rádio, tudo deu certo. Assim, fui jornalista por três meses e depois fui substituída. A Rádio Havana era muito popular no norte do Brasil.

SL: Depoiscorinthians e guarani palpitealguns anos na ilha, algunscorinthians e guarani palpiteseus amigos decidiram se mudar para a Europa, especialmente para Paris, e pediram que você os seguisse. Por que você optou por ficarcorinthians e guarani palpiteCuba?
MG: Não fazia sentido para mim ir para Paris. Na verdade, eu tinha um grande amigo, Sérgio Lara, que eu conhecia do Brasil, que morava na capital francesa. Ele era assessorcorinthians e guarani palpiteCésar Lattes, um dos maiores físicos nucleares do Brasil. Após o golpecorinthians e guarani palpiteEstado, ele foi morarcorinthians e guarani palpiteParis, onde tinha uma situação profissional muito confortável. Ele entroucorinthians e guarani palpitecontato comigo para pedir que eu o acompanhasse. Ele se comprometeu a pagar a escola para as crianças e me disse que eu poderia estudarcorinthians e guarani palpiteexcelentes condições. Foi uma oferta muito generosa da parte dele, mas eu recusei porque ainda tinha muito a fazercorinthians e guarani palpiteCuba. Olhando para trás, essa foi uma das melhores decisões que já tomei. Pude fazer muitas coisas na ilha para retribuir um pouco do que Cuba havia me dado. Passei os melhores anoscorinthians e guarani palpiteminha vidacorinthians e guarani palpiteCuba. Eu era muito feliz lá. Meus filhos também eram felizescorinthians e guarani palpiteCuba. Não havia motivo para deixar a ilha e ir para Paris.
SL: No seu bairro, vivia uma jovem chamada Hilda Guevara, que era filhacorinthians e guarani palpiteChe. Conte-nos sobre o encontrocorinthians e guarani palpitevocês.
MG: Meu filho Marcello tinha cinco anoscorinthians e guarani palpiteidade. Fui buscá-lo na escola e o encontrei sentado nas pernascorinthians e guarani palpiteuma garota que devia ter 17 anos na época. Ele me disse: “Ela é minha amante”. Ficamos amigos e eu não fazia ideiacorinthians e guarani palpitequem ela era. Pensei que ela fosse uma vizinha. Ela vinha à nossa casa regularmente. De vezcorinthians e guarani palpitequando, passava a noitecorinthians e guarani palpitenossa casa. Saíamos juntos, mas ela nunca me reveloucorinthians e guarani palpiteverdadeira identidade.

Seis meses depois, ela me convidou para ir àcorinthians e guarani palpitecasa e pediu que eu a perdoasse: “Eu menti para você e quero que me perdoe”. Ela me disse que era filhacorinthians e guarani palpiteChe. Foi um choque para mim, mas escondi minhas emoções na época. Todos nós éramos apaixonados pelo Che. Ela queria que as pessoas a amassem por ela mesma e não como filha do Che.

Nossa amizade se fortaleceu depois disso e ela me apresentou àcorinthians e guarani palpitemãe, Hilda Gadea. Entendi então por que o Che havia se casado com ela, porque ela era uma mulher fantástica. Hildita me mostrou todas as cartas que seu pai havia escrito para ela. Um dia, ela nos disse: “Vamos dormir na cama do meu pai”. Marcello, Eduardo e eu fomos até lá. Todos eles dormiram na cama do Che, mas eu não consegui dormir a noite toda. A emoção era muito forte.

Conheci pessoas maravilhosascorinthians e guarani palpiteCuba porque as pessoas são muito acessíveis. A revolução aproximou as pessoas. Há uma solidariedade, uma humanidade que une as pessoas.

SL: Quando você conheceu Fidel Castro?

MG: Conheci Fidel pouco depoiscorinthians e guarani palpitechegar a Cuba. Eu tinha um problemacorinthians e guarani palpitetireoide. Fiquei hospitalizada por um tempo. Um dia, após minha remissão, fui ao hospital com o diretor do departamentocorinthians e guarani palpiteendocrinologia. Eu estava com ele esperando o elevador. Havia pessoas atráscorinthians e guarani palpitenós, mas não prestei atenção nelas. Quando entrei no elevador, fiquei surpreso ao descobrir que era Fidel.

As pessoas que encontram Fidel pela primeira vez sempre ficam muito impressionadas porque ele é uma grande figura.

Fidel me reconheceu e perguntou à pessoa que estava comigo: “É a garota do avião, não é?” Eu não conseguia falar porque a emoção era muito forte. Ele passou a mão na minha cabeça e perguntou: “Por que você está pintando o cabelo?” Tudo o que consegui dizer foi: “Comandante, eu não pinto meu cabelo. É minha cor natural”. Conhecer Fidel é uma experiência muito especial. Imagine estarcorinthians e guarani palpiteum elevador com ele. Depois disso, eu o encontrei várias vezes e tivemos tempo para conversar mais longamente. Falamos sobre Cuba, Brasil e a situação internacional. Como você sabe, Fidel falava sobre tudo. Ele tinha uma inteligência superior e um vasto conhecimentocorinthians e guarani palpitemuitas questões. Você poderia discutir qualquer assunto com ele e ele sempre teria uma resposta. Um dia, eu estava na embaixada mexicana quando o presidente Luis Echeverría visitou a ilhacorinthians e guarani palpite1975. Fidel colocou seu braçocorinthians e guarani palpitevolta do meu ombro e me fez uma pergunta: “Vejamos, os russos bebem vodca. Os japoneses bebem saquê. Os mexicanos bebem tequila. O que os brasileiros bebem?” Eu respondi: “Não sei lhe dizer, comandante”. Ulises Estrada, um membro do Comitê Central que estava presente, riu e sussurrou para mim: “Diga a ele”. Você deve saber que no Brasil tomamos uma bebida alcoólica chamada “pinga”. Mascorinthians e guarani palpiteCuba, na linguagem popular, esse termo se refere ao sexo masculino. É um palavrão bastante vulgar. Finalmente, diante da insistênciacorinthians e guarani palpiteUlisses, resolvi lhe dizer o nome da nossa bebida. Ele ficou muito divertido.

SL: Falandocorinthians e guarani palpiteFidel Castro, há uma escultura do arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer que adorna uma praça na Universidadecorinthians e guarani palpiteCiências da Computaçãocorinthians e guarani palpiteHavana. Conte-nos sobre a gênese dessa obracorinthians e guarani palpitearte.

MG: Oscar Niemeyer havia dado a Fidel uma pequena escultura. Ela representava um enorme dragão lutando contra um homem muito pequeno que carregava uma bandeira cubana. A intenção era decorar uma peçacorinthians e guarani palpitemobília. Fidel gostou muito dela. Um dia, Niemeyer me perguntou se Fidel concordariacorinthians e guarani palpiteinstalar a esculturacorinthians e guarani palpiteuma praça. Fidel ficou muito entusiasmado. Então, durante semanas, fui o intermediário entre Fidel e Niemeyer, com a ajudacorinthians e guarani palpiteAbel Prieto, que era Ministro da Cultura. Além disso, Niemeyer havia decidido que eu seria o engenheiro-chefe da obra, embora eu não tivesse nenhum conhecimentocorinthians e guarani palpitearquitetura. Imagine ser o intermediário entre Niemeyer e Fidel! Niemeyer achava que uma esculturacorinthians e guarani palpiteoito metros seria suficiente, mas Fidel queria algo maior. A escultura acabou ficando com 16 metros. Na época, Niemeyer tinha 90 anos e Fidel 80. A praça é magnífica.

A última vez que vi Fidel foi na reunião com intelectuais no Centro do Convençõescorinthians e guarani palpite2012.

O retorno ao Brasil

SL: Em agostocorinthians e guarani palpite1979, o presidente Figueiredo assinou uma leicorinthians e guarani palpiteanistia que permitia o retorno dos exilados políticos ao Brasil. Depoiscorinthians e guarani palpitedez anos vivendocorinthians e guarani palpiteCuba, você finalmente teve a chancecorinthians e guarani palpiteretornar àcorinthians e guarani palpiteterra natal.
MG: Foi o Rui, meu marido na época, quem descobriu meu nome no jornal, na listacorinthians e guarani palpiteanistiados por decreto e que poderiam retornar ao Brasil. Foi um momentocorinthians e guarani palpitegrande alegria. Finalmente poderíamos voltar para casa e ver o Corcovado, o mar e as montanhas novamente. Mas quando chegamos ao aeroporto no Brasil, depoiscorinthians e guarani palpiteuma escala no Panamá, nós três fomos separadoscorinthians e guarani palpiteMarcello e Eduardo por várias horas para interrogatório, porque tínhamos acabadocorinthians e guarani palpitechegarcorinthians e guarani palpiteCuba. Eles queriam saber se meus filhos haviam recebido treinamento militar, apesarcorinthians e guarani palpiteserem apenas adolescentes. Um amigo que estava no mesmo voo alertou a imprensa sobre minha presença. Issocorinthians e guarani palpitecerta forma forçou as autoridades a nos libertarem. Pudemos retornar à nossa terra natal.
SL: Lula é novamente presidente do Brasil. Quando você o conheceu e qual é o relacionamentocorinthians e guarani palpitevocês hoje?

MG: Eu o conheci no anocorinthians e guarani palpiteque retornei ao Brasil,corinthians e guarani palpite1979. Ibrahim, meu ex-marido, foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores. Eu mesma era membro do PT. Eu era coordenadora cultural nacional do PT. Então fui me encontrar com o Ibrahimcorinthians e guarani palpiteSão Paulo e conheci o Lula. Somos amigos desde então.

Participei muito da luta pela liberdade do Lula quando ele foi preso injustamente. Lançamos a campanha “Lula Book”. Sou um dos fundadores do Museu “Lava Jato”, que reúne advogados, jornalistas e historiadores para preservar a memória histórica da injustiça que levou à prisãocorinthians e guarani palpiteum inocente Presidente da República por motivos políticos, com o objetivocorinthians e guarani palpiteimpedi-locorinthians e guarani palpiteconcorrer às eleições presidenciais. O que foi feito com Lula é indescritível. É um escândalo que vai alémcorinthians e guarani palpitequalquer compreensão.

Mas Lula saiu fortalecido. Ele estácorinthians e guarani palpitevolta e vai fazer muito bem ao Brasil. O povo brasileiro sofreu muito com Bolsonaro. Graças a uma grande coalizão, conseguimos ganhar o voto do eleitorado. Lula é um grande líder carismático que quer colocar o povo, os pobres, os que sofrem, no centrocorinthians e guarani palpiteseu projeto.

SL: Qual é acorinthians e guarani palpiterelação com Cuba hoje?

MG: Ainda tenho uma relação muito forte com Cuba e visito o país regularmente com o mesmo prazer renovado. Publico meus livros lá. O espaço dado à cultura é mais importante do que nunca, apesar das dificuldades econômicas e materiais. Tenho muitos amigos lá. Tenho uma paixão infinita pelo povo cubano e nunca esquecerei que eles abriram os braços para mim e me receberam durante um período crítico da minha vida revolucionária.

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